Afinal, carro elétrico polui mais que a combustão? Este estudo responde
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A eletrificação dos veículos parece um caminho sem volta ao nível global. Países da Europa Ocidental, além de diversas fabricantes automotivas, já determinaram prazos relativamente curtos para extinguir os motores a combustão de suas frotas ou seus catálogos.
Mesmo que indiretamente, o movimento já afeta o Brasil, que começa gradualmente a se familiarizar com a tecnologia e a receber em cada vez maior número modelos importados de concepção 100% elétrica. A Volvo, por exemplo, não comercializa mais modelos somente a combustão no país já a partir deste ano.
A Toyota, com Corolla e Corolla Cross, foi a primeira a investir na produção local de carros de passeio híbridos, enquanto a VW Caminhões iniciou recentemente o fabrico local de um caminhão leve 100% elétrico, o e-Delivery.
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Como consequência, devemos fechar 2021 com mais de 30.000 veículos leves eletrificados (híbridos mais elétricos) emplacados em um só ano, recorde absoluto em relação aos menos de 20.000 comercializados no ano passado.
É claro que um processo tão disruptivo como esse não passaria sem levantar dúvidas, inclusive quanto ao pretenso ganho em termos de emissão de poluentes. Os defensores dos carros a combustão alegam que modelos elétricos e híbridos poluem, na verdade, mais do que um térmico, além de gerar problemas quanto ao descarte das baterias.
Com isso, segundo eles, a promessa de um carro “zero-emissão” seria, na verdade, uma grande falácia, de modo a conformar governos exigentes e contentar consumidores iludidos com produtos que só fingem ser mais amigos do meio ambiente do que realmente são.
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Será que essa visão tão catastrófica é verdadeira? A própria Volvo parece ter uma resposta a essa pergunta. Um estudo recentemente publicado pela fabricante sueca na Europa mostra, na prática, as diferenças nos níveis de emissão de CO² entre um carro elétrico e outro a combustão, tanto na fase de produção quanto no uso cotidiano.
Método do estudo
Para tanto, a marca usou como parâmetros três modelos: um C40 (constituído desde o princípio como um modelo 100% elétrico), um XC40 T5 a gasolina (movido por um combustível do tipo E5, ou seja, com 5% de etanol na composição) e um XC40 Recharge, versão 100% elétrica do SUV.
A pesquisa considerou a extração e confecção de matérias-primas, produção do veículo, logística de distribuição, ciclo de utilização de 200.000 km e, por fim, descarte de lixo e resíduos. O resultado de tudo isso, para desespero dos deterministas de um lado ou de outro, é que... Depende!
Um carro elétrico, de fato, polui bem mais ao longo das fases de produção, mas pode compensar muito bem essa diferença ao longo de sua vida útil, desde que seja recarregado com boa dose de energia elétrica de origem limpa. Vamos aos dados — e aqui, focaremos na comparação entre as duas configurações do XC40, modelos equivalentes.
Elétrico emite 60% mais CO² só para existir
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Os críticos do carro elétrico têm razão quanto a um ponto: a produção de um veículo desse tipo ainda provoca muito mais danos ao meio ambiente que a de um equivalente à combustão. A diferença chega a expressivos 60%.
Segundo a Volvo, enquanto a fabricação de um único XC40 T5 emite 14 toneladas de CO² na atmosfera, a de um XC40 Recharge atinge 24 toneladas, sendo 7 toneladas geradas apenas pela produção das baterias. O carro, em si, demanda outras 17 toneladas, 3 a mais do que o irmão, por ser mais pesado (2.170 kg contra 1.690 kg) e exigir mais materiais.
Segundo a Volvo, só a extração, refino e estampagem de metais responde por 73% da poluição na fase produtiva de um XC40 T5. Aço e ferro são responsáveis, sozinhos, por 35%, contra 34% gerados pelo alumínio, 1% pelo cobre e 1% por outros elementos metálicos.
A inclusão de componentes eletrônicos, cada vez mais presentes em veículos modernos, provoca 13% das emissões, contra 11% emitidos por componentes de plástico, 2% por fluidos, 1% pelos pneus e 2% por outros materiais diversos.
No caso do XC40 Recharge, os percentuais dos metais caem para 51% (alumínio, 29%; aço e ferro, 19%; cobre, 1%; outros metais, 2%), mas não por um motivo nobre. É que as baterias de íons de lítio entram na jogada e assumem uma fatia de 29% das emissões, ante 9% de eletrônicos, 7% de plásticos, 2% de fluidos, 1% de pneus e 1% de outros materiais.
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O processo de montagem na fábrica da Volvo na Espanha gera mais 1,7 tonelada de CO² a cada XC40 T5 que sai da linha, índice que cai para 1,5 tonelada no caso do XC40 Recharge. Isso porque o modelo elétrico possui muito menos componentes para montar, especialmente na parte de motorização.
Todos os números incluem fases como formação, estamparia e forjação de componentes metálicos, eletrônicos e polímeros, bem como a eletricidade usada nos processos e o descarte de sobras de materiais.
No fim da vida, a Volvo estima que um XC40 T5 demandará mais 0,6 tonelada de CO² para ter seus componentes descartados, contra 0,5 tonelada de um XC40 Recharge — o estudo não considera o processo de descarte das baterias.
Assim, enquanto um XC40 T5 emite 16,3 toneladas apenas para existir e depois deixar de existir, o Recharge alcança 26 toneladas nesse mesmo processo, diferença de 59,5%.
Em quanto tempo de uso um elétrico passa a poluir menos
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Novamente, a resposta depende, desta vez da origem da eletricidade que alimenta o carro elétrico em questão. Se um XC40 Recharge usar apenas energia limpa e renovável em suas recargas, como a do vento, emitirá só 0,4 tonelada de CO² ao longo de 200.000 km e, assim, chegará ao fim do ciclo com menos de 27 toneladas acumuladas.
Ao mesmo tempo, o XC40 T5 expelirá 43 toneladas de dióxido de carbono pelo seu escapamento só ao longo dessa quilometragem, totalizando 59 toneladas.
Com isso, em apenas 49.000 km rodados o SUV elétrico compensaria os gases a mais que emitiu na fase produtiva, terminando a quilometragem com 22 toneladas de CO² “poupadas”.
Contudo, ainda não vivemos em um mundo que gera eletricidade a partir de fontes totalmente limpas. Pelo contrário: conforme a Volvo, 60% de toda a energia elétrica consumida pela humanidade atualmente ainda provém de fontes sujas, como usinas de carvão, gás ou derivados de petróleo.
Usando esse percentual como parâmetro, um XC40 Recharge recarregado 60% do tempo com eletricidade “suja” e 40% com energia “limpa” dispensará 28 toneladas de CO² na atmosfera ao fim de 200.000 km, totalizando 54 toneladas de poluentes emitidos ao fim de sua vida útil.
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São apenas 5 toneladas a menos do que o irmão a combustão gerará no mesmo ciclo. Neste segundo cenário, o XC40 Recharge levaria longos 109.000 km para “pagar” os poluentes emitidos a mais na fase de produção.
Em uma terceira situação, usando os percentuais médios de energia limpa (60%) e suja (40%) da União Europeia, o SUV elétrico soltará 18 toneladas de dióxido de carbono em 200.000 km, atingindo 44 toneladas no total, 15 a menos do que o XC40 T5. E equiparará as emissões extras da fase produtiva após 77.000 km rodados.
O estudo não considerou a possibilidade de o XC40 Recharge utilizar só energia de origem suja. Com uma regra de três básica é possível chegar ao resultado de 46 toneladas, totalizando 72 toneladas após 200 mil km rodados. Nesta hipótese um tanto surreal, o elétrico emitirá 13 toneladas a mais de CO² do que o irmão a combustão.
Esta última parte pode parecer exagerada ou catastrófica, mas não está tão distante assim da realidade. Em Fernando de Noronha, primeiro pedaço de território brasileiro a abolir carros a combustão, 90% da eletricidade provém de geradores a diesel, combustível ainda mais poluente do que a gasolina. Coisas do Brasil...
Tipo de elétrico também conta
Outra conclusão do estudo da Volvo é que, da mesma forma que dois carros diferentes consomem mais ou menos combustível, mesmo equipados com o mesmo motor a combustão, a depender da eficiência aerodinâmica de cada um, o tipo de carroceria conta muito para determinar o quanto um carro elétrico vai emitir de poluentes.
Por exemplo, enquanto um XC40 Recharge emitirá 46 toneladas de CO² com 100% de eletricidade “suja” ao longo de 200.000 km, sendo 28 toneladas com 60% e 18 toneladas com 40%, o primo C40, um crossover mais baixo e aerodinâmico, soltará, respectivamente, 40, 24 e 16 toneladas nas mesmas condições. São até 6 toneladas a menos.
Isso nos dá outro indicativo um tanto desesperador: ao mesmo tempo em que precisamos pensar cada vez mais em soluções contra as emissões de poluentes e o aquecimento global, estamos caminhando para inundar nossas ruas com veículos cada vez menos eficientes do ponto de vista aerodinâmico ou energético.
Conclusão
O carro elétrico pode ser muito menos poluente do que uma combustão. O estudo da Volvo deixa isso claro. Porém, ainda temos um longo caminho até encontrarmos novas soluções de baterias e novas fontes de eletricidade, mais limpas do que as atuais. Sem investimentos nesse sentido, todo o esforço para termos só carros elétricos nas ruas pode ser em vão.
Fonte: Mobiauto
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